Leia ouvindo: Bob Marley – Redemption Song
Manhã de segunda-feira, mais uma como tantas outras que já vivi. Trânsito, eu no volante guiando pra muito longe do meu próprio coração. O céu azul, azulzinho. Um convite pra viver uma vida que eu sempre desejei, mas que acabei não escolhendo. Tem dias que a saudade é mais pesada mesmo, foi o que pensei. Não serviu de remédio.
Perto da ponte, a minha playlist me pregou uma peça. O carro foi invadido por lembranças, um reggae com cheiro de mar, uma música que me dizia que a melhor coisa era poder viajar e se livrar do stress de São Paulo. O que Deus estava querendo me dizer, eu confesso que não sei, mas minha alma reagiu no automático. Seta pra direita, acelerei como se precisasse fugir muito rápido, antes que a minha extrema responsabilidade capricorniana me fizesse tomar juízo. Em questão de minutos, eu estava na direção contrária do caminho do trabalho. Estava a caminho do mar.
Algumas lágrimas caíram no percurso. A gente passa a adolescência toda pensando que ser adulto é gozar de muita liberdade, entra na faculdade com o sangue nos olhos prontos pra mudar o mundo, pra desbravar tudo o que a pouca idade nunca nos permitiu, pra ser feliz em todos os sentidos. Fomos criados pra fazer sucesso, pra chegarmos mais longe que os nossos pais. Nem preciso dizer sobre a decepção de descobrir que ser adulto é mesmo um porre!
Fui direto pro refúgio. Desde muito pequena eu sempre amei aquele lugar mais que todos os que já visitei. Aquela praia onde a água nunca foi das mais cristalinas, mas que meu coração escolheu pra morar. Estacionei o carro perto dos coqueiros, respirei fundo e deixei aquele aroma de paz e felicidade inundar o meu peito. Fui andando devagar, o sapato de salto ficou pelo caminho. A cada passo, eu me sentia mais em casa. Uma conchinha regressada, um coração de frente pro mar!
[ Imagem: reprodução ]
A água estava morna, o mar me recebia de braços abertos, poucas ondas, um barulho muito parecido com o da infância. A lembrança dos dias bons!
Eu precisei de longas horas ali pra conseguir colocar a vida no lugar. O meu choro, também salgado como aquele mar, me dizia que talvez a minha felicidade dependesse muito mais da minha paz interior do que de uma carreira de sucesso. Não que jogar tudo para o alto fosse o necessário, mas há quanto tempo eu me boicotava, me obrigando a viver uma vida que escolheram pra mim?
Somos todos pacientes terminais dessa louca vida. Na teoria, hoje é o último dia dessa caminhada. Ainda que a verdade seja assustadora, é só quando entendemos essa fragilidade que deixamos o ‘agora’ ficar mais bonito. Seja de frente pro mar ou na correria do dia a dia. É hora de dar mais vida aos nossos dias, de sermos mais inteligentes no que diz respeito aos nossos próprios cuidados paliativos, de deixar o riso solto nos acompanhar na viagem!
Nunca foi questão de ser uma vida ruim, calma! É só um dia ruim e logo mais ele acaba, adormece junto com o pôr do sol. Intimamente, sabemos o que faz o coração vibrar. As coisas simples que nos enchem de esperança para as novas batalhas. O ‘hoje’ é um dia muito especial, vale a pena lutar por ele. Ser adulto é voar muito longe, sim. Mas mais que isso, é saber reconhecer onde ficou o nosso ninho e voltar pra ele, se precisar. A felicidade é mesmo muito incerta, meus amigos, mas naquele dia eu descobri que tudo bem, desde que ela seja incerta num lugar bom!
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