Leia ouvindo: Guru e Erykah Badu – Plenty
A cozinha é o cenário para dois personagens. Ele e ela se encontram e desencontram por lá. Mesmo com os longos anos juntos, ainda não se acostumaram com o espaço que têm que dividir enquanto preparam uma refeição. Mas também não veem a menor graça em fazê-la separados. O gosto está ali na bancada, na pia e no fogão, na inocente disputa para ver quem desvenda melhor o prato. A comida é consequência de duas pessoas que tentam sempre acertar o ponto.

Desencontram-se no tempo de marinar, no “doce” da cobertura, na pimenta e se devem colocar mais orégano ou não. Entretanto, o que causa um impasse ainda maior é o sal. Um prefere mais suave, o outro gosta mais evidente. Se o sal é a gosto, como fazer cozinhando a quatro mãos? Eis o dilema, que sai da cozinha e invade nossas vidas.
Eles sempre tiveram que saber o quanto de “sal” botar nas coisas. Acho que não se dão conta disso: toda vez que vão pra cozinha, estão reproduzindo as inúmeras receitas incompletas que encontraram pelo caminho. Argumentam, ponderam e chegam a um acordo, nem que este seja um deles abrindo mão do sal que queria. E a louça sequer se acumula, a bagunça também é dividida.
Às vezes, ele vai lá na panela e coloca um tico a mais de sal, sem que ela veja, claro. Truques. A comida vai à mesa, os paladares avaliam e decretam que tudo saiu como esperavam, se não fosse aquele sal a mais – ou a menos. Sempre existe um ingrediente-problema em qualquer relação.
E mesmo discordando tanto na cozinha, chef nenhum colocaria defeito na liga desses dois. Impossível saber a dose certa de sal, não existe colher para isso. Existem duas pessoas que querem provar o melhor dos sabores quando estão juntas.
São arroz com feijão daqueles que não precisam de mistura. Sabem que o segredo de qualquer receita é fazer a boca salivar.
E o sal é a gosto de quem se gosta.
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